Quando se trata de ensinar ou de corrigir a técnica correta do agachamento, a maioria dos entendidos na matéria, isto é, instrutores de musculação e até licenciados em educação física, são rápidos a afirmar que os joelhos não podem passar da linha dos pés durante a execução do agachamento com barra.
Esta é uma ideia que se espalhou com bastante rapidez e que já se encontra firmemente instalada na metodologia de treino da grande maioria dos instrutores e praticantes de musculação que fazem o agachamento, mas será verdade, ou será mesmo isso o ideal?
A recomendação que vigora é a de manter a parte inferior das pernas o mais vertical possível durante o agachamento, impedindo os joelhos de passarem para além da ponta dos dedos.
A lógica por trás dessa recomendação é a de que o torque na articulação dos joelhos aumenta à medida que estes se deslocam para a frente. Sendo que portanto deve-se evitar isso a todo o custo de forma a prevenir lesões nos joelhos. Será isso verdade?
Já foi realizado um estudo sobre este mesmo tema, que nos poderá portanto responder a esta questão.
O estudo foi realizado em 2003 na Universidade de Memphis nos EUA, e para a realização desta experiência, os investigadores recrutaram 7 homens com experiência anterior de treino musculação e com a idade média de 28 anos, que foram filmados enquanto realizavam 2 variações do agachamento com barra até à paralela.
Numa das variações, os voluntários puderam colocar os joelhos para além da ponta dos pés, e na noutra variação foi utilizada uma barreira de madeira para impedir os voluntários de moverem os joelhos para além da ponta dos pés.
E os resultados:
No agachamento sem restrições, o torque nos joelhos foi de 150.1 (+/- 50.8) e o torque da anca foi de 28.2 (+/- 65.0).
No agachamento com restrições, o torque nos joelhos foi de 117.3 (+/- 34.2) e o torque na anca foi de 302.7 (+/- 71.2).
O agachamento restringido também produziu uma maior inclinação anterior do tronco e um maior ângulo interno nos joelhos e tornozelos. Assim sendo, pôde-se concluir que a técnica de agachamento usada pode afetar a distribuição de forças entre os joelhos e as ancas e as propriedades cinemáticas do exercício.
Os investigadores concluíram:
Embora a restrição do movimento dos joelhos possa minimizar o stress nos joelhos, é provável que as forças sejam inapropriadamente transferidas para a região das ancas e parte inferior das costas.
Portanto, a distribuição adequada da carga pelas articulações durante este exercício pode requerer que os joelhos se desloquem ligeiramente para além da ponta dos pés.
Aplicações práticas
Como pode ver, segundo este estudo, ao restringir a ligeira movimentação dos joelhos para a frente, estará sim a diminuir um pouco o torque na articulação dos joelhos, e portanto também a diminuir as probabilidades de lesão nos joelhos, mas há um preço a pagar por isso.
Esse preço é uma tensão muito mais elevada a ser suportada pelas articulações da anca e pela zona lombar. Aumentando assim as probabilidades de ocorrência de lesão nessas zonas.
Acontece que, ao impedir os joelhos de se deslocarem para a frente, somos obrigados a inclinar o tronco mais para a frente, de forma a conseguirmos manter o centro de gravidade alinhado com a parte do meio dos pés e evitar que a barra caia para o chão.
Essa inclinação extra provoca um aumento da força de torque nas articulações da anca e também a conduz a uma tensão bastante superior na zona lombar.
Sendo que não é incomum a ocorrência de lesões na zona lombar como hérnias discais e outros, esse risco extra parece-me desnecessário e inaceitável, sobretudo quando a maioria dos praticantes de musculação nem sequer participam em desportos de competição como acontece com o powerlifting e halterofilismo.
Conclusão
A meu ver, a recomendação que vigora atualmente de que não se deve permitir que os joelhos se desloquem para além da ponta dos pés durante o agachamento é errada e potencialmente perigosa para a saúde dos praticantes de musculação.
Para além disso, ao fazer isso, e ao inclinar-se obrigatoriamente para a frente, o que irá fazer na verdade, é realizar uma mistura do exercício bom dia (good morning) com o exercício agachamento.
Recordo também que é necessária a existência de forças de torque nas articulações dos joelhos durante a realização de exercícios, para que os músculos quadríceps possam ser trabalhados e portanto estimulados de forma a que ocorram adaptações positivas.
A minha recomendação é portanto que, durante a realização do agachamento com barra faça os possíveis para manter o tronco reto, e permitir que os joelhos se desloquem ligeiramente para a frente da ponta dos pés, conforme for necessário.
Referência! musculaocao.com